quinta-feira, 26 de abril de 2012

Amo Bishop Roden

Apaixonou-se pela integrante de uma seita religiosa; dissidente dos Protestantes e originária dos Estados Unidos mas com seguidores um pouco por toda a Europa. Estava internado num hospital. Na cama ao lado estava um seguidor da seita, tão moribundo quanto convencido da vida eterna que o esperava. Um grupo reformista que estudava a Bíblia, ano após ano, desde o Génesis ao Apocalipse. Todos os ofícios tinham por base a leitura e o comentário da Bíblia como texto fundador. Ela veio um dia de semana à tarde, já depois do horário normal da visita. Deve ter convencido as enfermeiras da bondade e necessidade da sua presença consoladora. Dar ânimo ao moribundo. Ajeitou a roupa da cama. Comentou algo relacionado com a luz que entrava pela janela. Não tinha outra ambição para além da vida eterna num vindouro paraíso celestial. Notava-se no modo como tocava nas coisas. Notava-se-lhe nas mãos. Colocava um extremo cuidado no modo como tocava. Como se a sua carícia cicatrizasse. O seu objectivo era passar com distinção no dia do julgamento final. E o moribundo, como seria de esperar, morreu ao seu lado. Não sem antes o ter visitado umas quantas vezes mais. Isso deu-lhe a oportunidade para conhecê-la. Trabalhava num escritório de transitários que estava à beira da falência. Nos tempos mortos lia os versículos do novo testamento com a concentração com que as crianças vêem pela primeira vez no circo o domador enfiar a cabeça na boca do leão. Uma pessoa com o seu temperamento, niilista, anárquico, seria decerto a última pessoa do mundo a quem ela chegaria a dar atenção.

(...)

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