terça-feira, 7 de junho de 2011

Low cost

A chegada do tempo quente provava-se, um ano mais, através dos engarrafamentos na estrada marginal. Levava três t-shirts e dois calções. Roupa interior dobrada e acomodada a um espaço mínimo. Acabava de ganhar um prémio, vamos dizer suficiente, para passar os meses de estio em Zagora, apenas interessado em si próprio. Uma t-shirt enxugaria, a outra estaria vestida e a última esperaria vez.

>>> Quantos serão capazes de uma ousadia como a minha? Estava praticamente sem dinheiro e devia conseguir o bastante para comer, pagar as contas e tudo isso. Não foi o que fiz. Nunca faço o que é esperado. Dei várias voltas a um bairro que fica perto da estação, onde os bares cheiram a mofo e a fritos, onde param muitos senegaleses. Não fui a nenhum casino. Nota após nota e logo moeda após moeda, depositei-as nas ranhuras correspondentes de uma tragaperras, e os velhos e as perras olhavam e eu continuava no meu. Não parava de soltar dinheiro. Primeiro de um envelope, depois de uma carteira, e finalmente directamente das calças, as ultimas moedas sacadas directamente dos bolsos traseiros das minhas calças gastas e cómodas. Olhei triunfante para os circunstantes; sim ganhava, e depois? Bastava de expectativa. As moedas caíam na bolsa de canguru da máquina. Pedi um saco de plástico. A máquina estava atestada, os primeiros sons, ruído repetitivo e metálico proporcionado a quem quisesse escutar; à altura do meu sexo tombavam as primeiras moedas de dois euros; pareciam pelar as paredes onde eram vertidas, saltavam chispas cinzentas, e caíam moedas sobre moedas e finalmente o som abafava-se. Pedi segundo e terceiros sacos, preferia reciclados, por favor, já me punha arrogante com o dinheiro repentino. E não parava de jogar. Digo jogar, por dizer algo, estava finalmente a recuperar o que me pertencia, apenas resgatado de um modo extraordinário. Aquilo que havia de ser meu, às mãos me havia de chegar. Nunca perdi essa certeza e quando entrei naquele covil adivinhava a hora; porque não merecia fortuna diferente. Cheirava a mofo, a desleixo, o ambiente que me satisfazia. Uma vez entrei no casino e andei tenteando, atemorizava-me com os jogadores concentrados e em silêncio, quase perdia o equilíbrio, o que se passou no casino foi de uma avareza inclassificável; mais tarde senti nojo, comportei-me como se a todo o momento o céu se abatesse e precisasse protecção que só podia ser comprada com as poupanças de meses, se alguém espera alguma recompensa é necessário abandonar tudo de uma só vez e sem olhar para trás, como fatalmente não percebeu a mulher de Lot. >>>

Uma mala de mão onde não cabia mais que o tecido suficiente para tapar o peito e as costas. Cobrir metade dos braços e metade das pernas. Voltaria. E viveria como sempre viveu antes da tragaperras começar a bolçar moedas. Sobrevivendo e esperando o momento estrelar que de novo alterasse a sorte da forma mais transitória possível.

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