quarta-feira, 9 de fevereiro de 2011

Elena

É mais velha que eu alguns anos. Deve ter trinta e cinco. Todas as segundas e quartas-feiras dou aulas de português ao marido que é arquitecto paisagista e gostava de trabalhar em Portugal. Ele também é mais velho. Talvez 45 anos. Mas parece muito mais novo. É o homem mais agradável que já conheci. Harmoniza simpatia, pacatez, inteligência, juventude e maturidade. Às vezes fica nervoso quando não pronuncia perfeitamente alguma palavra. Uma vez, num exercício de vocabulário, pediu delicadamente para descrever o rosto de Elena. Senti-me a pessoa mais indecente do mundo por assistir à descrição do José. Por ajudar na escolha das palavras adequadas. Ela é mais nova que ele e tenta parecer mais velha. Não consegue. Apenas a vejo, no início ou no fim das aulas. Ou quando vem dar algum recado, quando precisa de algum objecto que ficou no estúdio. De sorriso omnipresente, utiliza sempre a mesma expressão ligeira para sorrir, aquela expressão de quem sabe mais do que aquilo que dá a entender. A última vez não resisti a segui-la com os olhos enquanto deixava livre o piso inferior. Vestia uma saia branca bordada com flores e subia as escadas com o sorriso de sempre, ainda com os olhos no hall de entrada, onde estava eu e o José, em silêncio, dignificando a sua saída de cena, o som dos sapatos nos degraus.
Nesse mesmo dia, estávamos próximos do final da hora e meia de aula, a Elena abriu a porta de correr do estúdio e sentou-se entre mim e o José, que estávamos frente a frente. Não disse nada. Eu olhei para a Elena. O José olhou para a Elena. A Elena olhou para mim. A Elena olhou para o José. Entreolhámo-nos e acho que ela queria ouvir alguma frase que pudesse repetir, em castelhano, em português, não importava o idioma.