sexta-feira, 26 de junho de 2009

Denegação

J.M. Coetzee é um autor insuspeito. Li Desgraça por apontar o nome do livro, ainda antes de ter ganho o Booker, e mais tarde por desarrumação ter encontrado a nota. Ficou-me o distanciamento em relação à temática – a África do Sul. Mas gostei da escrita incorruptível. É por isso que sigo, sempre com renovado interesse, os seus ensaios e críticas. Finalmente adquiri Inner Workings: Literary Essays que retoma muitos dos «meus» escritores. Beckett, Musil, os dois «Roth’s», Bellow, Svevo, entre outros sacanas. E claro, Walser. Sobre o escritor suíço, Coetzee faz um retrato biográfico directo e diferente da magnífica «narrativa do pensamento» a que estou habituado com Vila-Matas (que é provavelmente o escritor que mais refere Walser). Não é preciso romancear a vida do escritor dos Microgramas ou emprestar-lhe uma angústia previamente esboçada. Ele é o supremo anti-herói. Mas isso somos nós que dizemos confortavelmente instalados no presente e com uma vontade de perdição que é mero e insultuoso desenjoo. Para o homem Walser não era assim. Li o ensaio sobre Walser ainda sentado na Fnac. A maior parte dos dados biográficos já os conhecia mas o que se segue, se o soube alguma vez, devo ter recorrido ao velho mecanismo psicanalítico da «denegação». Não evitei a gargalhada misturada com lágrimas e aperto no peito. Coetzee citava Walser sobre a tentativa frustrada de acabar com a vida: «Nem sequer pude fazer uma forca em condições.»

1 comentário:

  1. Li Desgraça e gostei imenso.
    Sou um apreciador de literatura sul-africana e Coetzee faz parte das minhas referências, embora tenha especial predilecção por Alan Paton e por Nadine Gordimer. Há, porém, outro autor que considero igualmente interessante, embora não tenha tanta visibilidade como os anteriores: Mark Behr, cuja obra The smell of the apples recomendo vivamente a quem quiser ter uma breve noção sobre o Apartheid.
    Enfim, a literatura sul-africana é bastante rica do ponto de vista humano, político e social. Recomenda-se!

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